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ENSAIO 11: TELEMETRIA E TELEPATIA

Atualizado: 15 de jul.



Se você está aqui pela primeira vez este ensaio faz parte de um livro sendo escrito em tempo real seguindo a narrativa do fluxo de consciência, se te interessar acompanhar o processo comece pelo primeiro.



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05/07/2022


TELEMETRIA E TELEPATIA


John estava procurando aliens e encontrou apenas outro John.


Amigos estranhos, amores inesperados e recados óbvios.


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John Was Trying to Contact Aliens é um dos filmes mais lindos que eu já assisti.


Na verdade não é um filme, é um documentário.

Na verdade também não é um documentário, é um curta-metragem.


Tem apenas dezesseis minutos e deveria ter três horas ou talvez não, dezesseis minutos é o suficiente para passar uma mensagem universal.


O Fefo fez o favor de me relembrar e aí assisti de novo para ter esta certeza, mas antes precisamos falar sobre quem é o Fefo.


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O Fefo é um daqueles amigos estranhos que não valem um ovo, não merecem um copo de água se visitam a sua casa e não compensam o capim que comem.


Some e reaparece de tempos em tempos para então sumir de novo e um dia, quem sabe, reaparecer, tipo um Mestre dos Magos desfalcado de sabedoria.


Anos atrás as coisas eram bem estranhas nas festas, uns usavam cabelo vermelho e outros dançavam, outros usavam calça colorida e o Fefo tentava se enturmar comigo elogiando o meu celular que abria e fechava e ficava com a tela azul.


"Não existe outra marca de celular com essa telazinha azul da hora, foda".


Nesta época para não socializar eu ficava abrindo e fechando meu celular de flip e fingia que estava sempre recebendo mensagem de alguém.


Fefo já teve profissões estranhas (nenhuma registrada em carteira para comprovar) como lambedor de selo, enxugador de gelo, apertador de apoio de geladeira, grampeador de saco de bolacha, provador de azeite de soja, raspador de vela de cemitério e atualmente passa os dias tentando não pegar vírus na deep web e ligando para a Rússia tentando descobrir se as lendas do 4chan são reais.


Fefo tem dois filhos, o menino ele educa para escola da vida com Racionais MC's, a menina apenas torço para ele não educar ela com Anitta.


O seco, o tripa seca, o curíntia, o nóia, o doidão, o pau de virar tripa, et bilú, pai, DJ, motoqueiro, hacker de fliperama, porteiro de casa da luz vermelha.


Se você nunca viu ele pessoalmente não se assuste, ele é inofensivo e envelheceu na fase de tentar assustar as pessoas colando granadas de papel pela cidade e desenhando pentagramas por onde passa.



Mas eles fez o favor de me lembrar deste filme/documentário/curta-metragem então vamos ler o que ele diz sobre, preservei o título em CAPSLOCK porque o exagero é coerente.


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JOHN WAS TRYING TO CONTACT ALIENS É UMA HISTÓRIA DE AMOR MELHOR QUE CREPÚSCULO


Nas poucas noites em que olho para o céu a última coisa que vejo são as estrelas ou nossa lua.


Olho para a imensidão do espaço com minha imaginação. Faço isso vislumbrando a existência de outras civilizações, onde um outro indivíduo estaria dividindo aquele momento comigo.


Compartilhando as mesmas dúvidas, mas em um planeta remoto.


John se apresentou como uma pessoa extremamente sozinha, talvez pela rejeição que sofreu de seus pais ou por sua orientação sexual em uma cidade interiorana norte americana. Autodidata e de inteligência inquestionável, recebeu apoio dos seus avós para construir equipamentos de extrema complexidade. Equipamentos que lhe permitiriam contatar inteligências remotas.


Por grande parte da sua vida fez disso seu propósito.



Talvez o verdadeiro motivo para procurar vida fora da Terra seja a lucidez de sua discrepância com o espaço-tempo que ocupava. Sua solidão, ou solitude, só era confrontada com o suporte que recebia de seus avós.


Eles o amaram e apoiaram o projeto que lhe dava significado. Passaram a dividir casa com osciladores, amplificadores e osciloscópios. Quando não mais couberam, John e seus avós construíram um laboratório.


Amor é altruísmo, é compreensão, é suporte.


Por mais complexas que sejam as máquinas não vejo John como um cientista. Vejo John como um romântico. Escolheu a música como sua mensagem para o espaço, escolheu criteriosamente seu acervo de discos e transmitia um programa de rádio até duas vezes a distância da lua.


A naturalidade das transmissões e a verdade com que ele se comunica com os ETs me fez desejar que tivesse ao menos um ouvinte, me fez desejar que este ouvinte fosse um fã e esperasse ansiosamente pelo programa do próximo dia em calendário terrestre.


Por fim talvez John fosse o ET e estivesse apenas tentando se conectar a alguém. Sua escolha por uma busca extraterrena poderia estar relacionada com a falta de encaixe na realidade física que ele orbitava.


O documentário encerra com os equipamentos sendo desmontados e sem nenhum dado concreto coletado. Mas pouco se lamenta sobre isso. A busca preencheu sua vida de música e significado até obteve o que tanto procurou: um final feliz.


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Eu não precisaria escrever mais nada mas, como eu já estraguei a biografia não autorizada dele falando sobre a pessoinha por trás da pessoa, posso muito bem também escrever aqui o que eu mesmo pensei sobre esse filme-documentário-curta-metragem.


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No S.O.S. mais calmo, lento, perseverante, longo e solitário (e de certa forma, silencioso) da história John enviou sinais e músicas durante 30 anos a uma distância de milhares e milhares de quilômetros, tentando entrar em contato com alienígenas, uma iniciativa nomeada por ele como Project STRAT, Special Telemetry Research and Tracking, ou Telemetria Especial de Pesquisa e Rastreamento.


Tocava músicas de Kraftwerk, Tangerine Dream, Harmonia, Robert Fripp, Brian Eno, Can, Fela Kuti e me pergunto se talvez não tenha sido esse o motivo dos alienígenas nunca terem respondido John porque esses músicos são seguramente de outro planeta, representantes da MPM (Música Popular Marciana) e os pequenos homens verdes provavelmente confundiram os sinais do John com a Interestelar Itapema FM deles.


Tocou tudo o que alien gosta de escutá ham-ham mas deve ser por isso que ninguém veio procurar.


E se aquele japa maluco do Can não é um alienígena, eu não sei mais o que poderia ser um alienígena.



John estava tentando encontrar alienígenas e terminou por encontrar a si mesmo e a sua alma gêmea, tão gêmea que o amor da sua vida se chamava John também.


Nada mais óbvio, amar e ser amado são dois mundos coexistindo no mesmo universo e se um outro planeta igual a terra é uma possibilidade matemática, com o amor não seria diferente.


Parece que deu tudo certo não?


Relacionamentos são como corpos celestes, uns orbitam, outros entram em choque e ambos se destroem, uns passam voando e deixam rastros, uns se atraem e outros se repelem e alguns são até mesmo e literalmente um buraco negro, e outros são especiais como partículas atômicas ainda não descobertas e outros ainda parecem eternos mesmo após o fim como luz de estrelas mortas há milhões de anos mas ainda brilhando.


Em um universo cheio de bósons e mésons e prótons em um planeta cheio de projeções aleatórias e espelhamentos triviais John encontrou o seu isômero, um barbado tão feio e estranho quanto ele, dois hippies com sorrisinho de Jerry Garcia mas que se fizessem ménage com mais um camarada com toda certeza o nome do trio seria ZZ Top.



Mas calma lá, se você não deve discutir gostos ou perguntar o que se passa na cabeça de uma pessoa imagina tentar entender o coração dela.


Gosto é como cu, cada sistema solar tem o seu, cada um no seu quadrado, cada galáxia com seus quadrantes, procurando aliens por telemetria, fazendo amor por telepatia e trocadilhos ruins por pura mania.


Até onde sei eles não adotaram filhos, uma pena, chamá-los de Johnsons & Johnsons seria sensacional e me pergunto se o A de LGBTQIA+ não seria a inicial de Aliens.


Nada pode ser mais inclusivo que considerar todas as formas de amor possíveis no universo.


Será que ETs possuem os seus próprios movimentos inclusivos?


Movimento MVTMJSUN+luas e estrelas para incluir Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e todas as luas e tudo o mais que brilha?


Eu acho Saturno a maior drag queen do universo mesmo.


E Plutão?


Não sabe se é planeta ou se é lua, o primeiro bissexual interestelar de todos os tempos.


Na matemática das probabilidades de possíveis vidas e de todos os planetas possivelmente habitados, nos meus cálculos o Planeta Terra é definitivamente o mais brega e John Was Trying to Contact Aliens poderia ser o Independence Gay (ou Battlestar Glitterática) onde os sinistros villagepeoplenianos invadiriam a terra em naves glitterizadas e a Disco Music dominaria, mas está mais para um Brokeback Moon, dois solitários se encontrando no momento certo, no planeta certo, no universo certo.



E veja só, não é apenas uma história de amor (infinitamente, literalmente) maior que Crepúsculo, é também sobre avós, as estrelas mais velhas, os guardiães do universo.



Eu deveria ter avisado que meu texto contém spoilers mas histórias de amor não são necessariamente de outro mundo e não deveria haver surpresas ou suspense em falar sobre, elas podem ser contadas até de trás para frente e continuam tendo mais sentido que o próprio O Sexto Sentido, até mesmo porque O Sexto Sentido ao contrário não é nada além (do além?) de uma assustadora história de amor, esse sentimento que atravessa o tempo, o espaço e não conhece a morte.


Afinal como diria Carl Sagan, todos nós somos feitos de pó de estrelas, e temos todos treze bilhões de anos de idade.


Nascemos antes de nascer e não morreremos depois de morrer, e você sempre poderá ser alienígena no planeta dos outros.



O mesmo Carl Sagan escreveu para a sua esposa Ann Druyan aquela que, se não é a mais linda, é com certeza a declaração/dedicatória de amor mais elegante de todas:


- Dada a vastidão do espaço e na imensidão do tempo, é uma alegria poder compartilhar um planeta e uma época com Annie.


John Was Trying to Contact Aliens também é uma declaração de amor e como eu disse antes deveria ter três horas de duração mas isto é egoísmo da minha parte, dezesseis minutos é o suficiente para passar o recado: amor é uma mensagem (infinitamente, literalmente) universal, simples e de sinal contínuo, e por vezes intermitente, mas está sempre aí no ar.


Só não pega quem está mal sintonizado.



Seja lá qual for a sua sintonia, o amor não passa de um grande e constante exercício de comunicação em um universo cheio de perguntas sem respostas e um planeta cheio de respostas para perguntas que nem sempre temos coragem de fazer.





Talvez o segredo para encontrar seja não procurar.



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In your mind you have capacities you know

To telepath messages through the vast unknown

Please close your eyes and concentrate

With every thought you think

Upon the recitation we're about to sing


Calling occupants of interplanetary craft

Calling occupants of interplanetary most extraordinary craft


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Sigmund Freud (que nunca viajou para o espaço mas mergulhou fundo no nosso universo) anotou o que ele considerava as três feridas narcisísticas, os três grandes golpes no ego da humanidade:


- Que não éramos eternos.

- Que não éramos o centro do universo.

- Que não éramos únicos, mas descendentes de uma linhagem evolutiva em comum com os macacos e chipanzés.


A quarta ferida será quando descobrirmos não só não estarmos sozinhos como provavelmente seremos inferiores aos nossos vizinhos interestelares.


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Por falar em outras vidas e em outros mundos, você já assistiu o filme Another Earth de 2011?


Um dia os habitantes da Terra acordam com outra Terra no céu, praticamente ao lado da lua e especula-se que os habitantes dessa segunda sejam exatamente os mesmos da primeira mas levando outra vida ou seja, um outro você mas com outras expectativas e sonhos e paixões e muito possivelmente, outras frustrações, outros passados, outros traumas e outros medos.



E existe a possibilidade de você ir até lá encontrar você, o seu outro você.


O que você faria?


Procure e assista, se John ficou trinta anos procurando aliens você pode perfeitamente perder três minutos da sua vida procurando um torrent com legenda.


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But maybe there is another way of seeing this world. If any small variation arises - they look this way, you look that way - suddenly maybe everything changes and now you begin to wonder, what else is different?


Well, one might say that you have an exact mirror image that is suddenly shattered and there's a new reality. And therein lies the opportunity and the mystery. What else? What new? What now?


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John procurou longe demais, e a resposta estava mais perto que ele imaginava.


John encontrou na tal da vastidão do espaço-tempo a si mesmo, um outro ele e por fim o amor.

E claro, John pode não ter encontrado vida extraterrestre, mas provou o mais óbvio dos mistérios do universo: não existe vida sem música. E pessoas que mandam músicas importam.


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Por falar em pares e amores e encontros e desencontros, uma vez me perguntaram quais os dez melhores pares, ou as dez melhores duplas, ou as dez melhores combinações da história, fui até cento e trinta (e dois).


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1 comentario


Yasmine Holanda Fiorini
Yasmine Holanda Fiorini
04 jul 2022

O texto todo legal e tal. Eu: "mas chamá-los de Johnsons & Johnsons seria sensacionakkkkk"

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